2.
por vezes a tua cara torna-se nítida e insuportável.
Outras vezes, esbate-se e com o esbatimento vem-me a resignação
de te ter perdido. Às vezes, esqueço-te. Ou ficas escondido numa casa,
num quadro, numa árvore, de onde ressurgirás. Um dia olharei o quadro,
a casa, a árvore, e lembrar-me-ei de ti. Mas cada vez haverá menos
sítios onde te esconderes.
a tua face vem e atira-me sempre para o mesmo tempo,
é uma face que o ódio esquece, anterior à deserção,
a face de quem encontrou a primeira palavra,
é essa que me olha nos sítios mais vulgares.
Não te procuro: de repente, estás ali.
Como uma arma.
O límpido assassino.
Rui Nunes
in Ouve-se sempre a distância numa voz
Relógio D'Água